Julia Amaral é a artista apresentada nessa semana, dentro do programa de parcerias da Rede Choque, com destaque para nossos parceiros de Florianópolis: o Armazém e Coletivo Elza. A curadora convidada para nos apresentar as artistas do Armazém e Coletivo Elza é Juliana Crispe.
A artista Julia Amaral tem como procedimento para construção de suas obras uma interlocução com a natureza. Insetos, animais, pedras, areia, barro, são alguns dos componentes recorrentes em seus trabalhos, bem como os quatro elementos: Fogo, Terra, Ar e Água.
Há também um rearranjo constante nas obras de Julia, onde a costura atemporal parece fazer-se sempre em desdobramentos, ora as obras são, em si, as linguagens iniciais criadas em suas primeiras materialidades como a escultura, a fundição, o desenho, o carimbo, o adesivo; ora tornam-se artefatos nos quais a artista desdobra a fatura em instalações, intervenções urbanas, fotografias, tornando-as novos meios que interagem de forma anacrônica, ressurgindo em sua produção.
Segundo Julia: quando agrupo esses animais, essas fotografias, estabeleço uma afinidade entre os bichos, monto uma multiplicidade. Não busco uma narrativa, não busco contrapontos formais. O processo criativo tem as portas abertas, a grade comporta o crescer, o numero de elementos do trabalho pode aumentar ou também diminuir. O arquivo de fotografias é extenso e o trabalho está destampado para se reconfigurar, mudar, se transformar em outras multiplicidades. Seus elementos formigam, assim como meu fascínio, formando um arranjo possível, uma matilha, um enxame, um ossuário. E considerando cada elemento dessa matilha que é a multiplicidade, não mais civilizados pela configuração do trabalho, tento me aproximar deles em volta da fogueira.
Nas séries aqui apresentadas, transitamos por esses movimentos múltiplos, trazendo um recorte deste seu olhar para os elementos da natureza, pensando o animal como dispositivo que interroga sobre conceitos da natureza, do natural, do interno e externo, produzindo composições aparentemente corriqueiras, mas carregadas de complexidades, ativando relações entre a vida e a morte, a natureza natural e a forjada, elementos arrancados de seu habitat, transfigurando as lógicas e ativando outros tempos, na relação entre o efêmero e a permanência pelo objeto, entre a infinitude e o esgotamento.
Ao apontar elementos internos da natureza para o fora, na apropriação de animais de seu convívio aos animais encontrados mortos, Julia Amaral cria interlocuções sobre a natureza da vida, sua fragilidade e fugacidade, vertendo-nos também para o deslocamento da natureza e sua permanência. Julia torna natural o que não estamos acostumados a olhar; um pássaro morto, um besouro, uma rã, insetos em decomposição, ovos quebrados, como convivência do real. Ao olharmos os animais realocados, nos vemos enquanto seres em nossas fragilidades, processos decompositores em que envolve a todos e nos traz o mesmo destino comum dos seres vivos.
Porém, o que Julia também nos traz é a perpetuação da existência, numa presença metafórica pela matéria de uma continuidade.
Assim não há um procedimento por cartilha que acione os trabalhos da artista, o que há são multiplicidades que não definem, são composições simbióticas e heterogêneas. Ao colecionar animais, insetos, modos de vida e suas efemeridades, Julia inventaria a existência e contrapõe a impossibilidade da permanência, aponta também para singularidades, para um tempo que corre lento, que insiste no olhar para o menor como potência, como transformação, como deslocamento e uma percepção de tempo que aponta um movimento alquímico, na transmutação da vida e na transformação da matéria.

série urubus, 2015/2020, adesivo vinil recortado/ intervenção urbana dimensões variáveis, 40 x 70 cm (aproximadamente)

série gatos, 2009, adesivo vinil recortado e stencil / intervenção urbana, 35 x 60 cm (acima) 30 x 45 cm (ao lado) versão na cor preta e branca

apesar de, 2004-2010 série de esculturas em fundição pássaro, 2004, fundição em latão, 10 x 13 x 5 cm besouro de asa aberta, 2005, fundição em prata e cobre, 4 x 6 x 2 cm mariposa, 2010, fundição em prata e cobre, 6 x 6 x 2 cm louvadeus, 2010, fundição em bronze, 8 x 6 x 4 cm lacraia, 2008, fundição em prata, 5 x 1 x 2 cm aranha, 2009, fundição em prata e cobre, 6 x 5 x 2 cm marimbondo, 2009, fundição em prata e cobre, 3 x 2 x1 cm sapo, 2007, fundição em bronze, 5 x 3 x 1 cm
Julia Amaral nasceu em São Paulo/SP em 1978, vive e trabalha em Florianópolis/SC desde 1998. É artista, pesquisadora e professora. Desenvolve seu trabalho através de intervenções urbanas, esculturas, fotografias e ações. É integrante da editora independente Corpo Editorial com Aline Dias e Ana Lucia Vilela. Atualmente é doutoranda no PPGAV/UDESC e professora substituta de Escultura nos cursos de Bacharelado e Licenciatura em Artes Visuais na Universidade de Estado de Santa Catarina. Trabalha também com direção de arte e cenografia de cinema e teatro e com concepção e montagem de exposições.